Mesmo com decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinando a manutenção do quórum necessário para realização das sessões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), o presidente do tribunal administrativo suspendeu os julgamentos agendados para ontem, terça-feira, por falta de paridade nas turmas. Estavam previstas sessões da 1ª Turma da Câmara Superior e das turmas ordinárias da 2ª Seção.
A questão envolve interpretações diferentes da decisão da ministra Regina Helena Costa, do STJ. Para o Sindifisco Nacional, em greve desde o último dia 20, a determinação foi apenas para que haja quórum mínimo, sem menção à paridade. Já a Advocacia-Geral da União (AGU) defende que deve haver paridade entre os conselheiros da Fazenda e dos contribuintes.
A Portaria Carf/MF 1536/23, assinada pelo presidente do órgão, Carlos Higino Ribeiro de Alencar, suspende as sessões em razão da “falta de quórum determinado pela decisão liminar do STJ na PET 16334/DF nos termos do Parecer de Força Executória da AGU nº 01761/2023/PGU/AGU”. Nesse parecer, a AGU interpretou que a decisão da ministra Costa determina a manutenção do “quórum mínimo paritário necessário para o funcionamento adequado” do Carf.
Neste parecer, a AGU pontua que a interpretação de que o “quórum necessário” mencionado pela ministra seria o quórum mínimo regimental não alcançaria a finalidade da petição ajuizada pela União. Além disso, citou que os fundamentos da decisão evidenciariam que a determinação é para funcionamento paritário das turmas.
Procurada sobre as repercussões da suspensão das sessões, a AGU não retornou os contatos do JOTA. O órgão foi questionado sobre a possível aplicação de multa de R$ 30 mil, prevista na decisão do STJ, por cada sessão não realizada em razão do movimento dos auditores.
O Sindifisco Nacional, por outro lado, considera que o quórum mínimo é de cinco conselheiros, independente da composição ser paritária entre representantes da Fazenda Nacional e dos contribuintes ou não.
Em nota publicada na segunda-feira, o Sindifisco afirmou que seguiria a ordem do STJ, mas alertou que a realização das sessões sem a paridade poderia “vir a colocar em risco o interesse público”. O Sindifisco ainda pediu que o governo atenda as reivindicações da categoria, envolvendo a inclusão do bônus de eficiência no Orçamento de 2024, e a suspensão das sessões durante a greve.
Interpretações
Anete Mair, do escritório Gaia Silva Gaede, defende a interpretação do Sindifisco. “O Sindifisco está correto. Você tem a composição paritária, estabelecida em regimento, mas a decisão da ministra Regina fala em quórum mínimo, e não em composição paritária”, destaca Mair. A advogada ainda aponta que já ocorreram julgamentos com falta de um conselheiro, ou seja, sem a configuração paritária.
Lívia de Carli Germano, sócia do escritório Barros Pimentel Advogados e ex-conselheira do Carf, ressalta que há um ambiente instável para os julgamentos do órgão com as sessões suspensas nas últimas semanas. Germano também aponta que há uma nota de 2017 publicada no site do Carf em que o órgão esclarece que a realização das sessões é possível quando presentes a maioria dos membros, independentemente de serem representantes da Fazenda ou dos contribuintes.
“Se nem com decisão do STJ [o Carf] voltou a funcionar, porque interpretam a decisão do jeito que convém, contrariando inclusive o site do Carf, que diz que paridade não é equilíbrio de julgadores de um lado e de outro, então a gente não consegue dizer mais nada. Está bem instável, a gente não consegue prever quando vai voltar a julgar”, disse.
Luiz Romano, do escritório Pinheiro Neto, destaca que trata-se de um “jogo de interpretações”, que deve ser definido pelo próprio STJ. “O melhor intérprete é o STJ, que vai decidir se trata-se de quórum mínimo ou paritário”, diz.
Julgamentos previstos e suspensos
As sessões marcadas para esta terça-feira (5/12) seriam virtuais. Na pauta da 1ª Turma da Câmara Superior constavam processos como o 16561.720129/2018-50, da Telefônica Brasil sobre amortização de ágio, e do 16561.720237/2016-61, sobre dedutibilidade de royalties da Arcos Dourados.
Além desta terça-feira, o Carf já havia cancelado as sessões das duas últimas semanas de novembro, do dia 21 ao 23 e do dia 28 ao 30. Nas ocasiões, as portarias mencionavam que o motivo seria a adesão dos conselheiros representantes da Fazenda Nacional ao movimento grevista.
Fonte: Jota