Receita Federal nega créditos de PIS/Cofins por gastos com LGPD

A Receita Federal se manifestou, pela primeira vez, negando direito a créditos de PIS e Cofins sobre gastos com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) para uma empresa de tecnologia – atividade para a qual a segurança sobre informações dos clientes é essencial. O entendimento está na Solução de Consulta da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) nº 307, publicada pela Receita no dia 14 de dezembro para orientar os fiscais do país.

No regime de apuração não cumulativa das contribuições, se esse direito for reconhecido, o total dos créditos de PIS e Cofins será de 9,25% sobre os valores gastos.

Em geral, pequenas e médias empresas têm desembolsado entre R$ 50 mil e R$ 800 mil ao ano na implantação das exigências da LGPD, segundo estimativa da PwC Brasil. Nas de grande porte, diz a consultoria, esses gastos variam de R$ 1 milhão a R$ 5 milhões.

“A empresa que fez a consulta é de um segmento que tem que ter uma grande preocupação com a proteção de dados, no qual esse investimento é essencial para o negócio, e, mesmo assim, a Receita teve uma interpretação restritiva”, diz Douglas Campanini, da Athros – Auditoria e Consultoria.

Na consulta, a empresa diz que funciona como uma carteira digital de pagamentos e presta serviços como recarga de celular, recarga de cartão de transporte, pagamento de contas e boletos, cartão pré-pago, envio de dinheiro entre contas cadastradas na plataforma e vale-presente, entre outros. Por isso, é obrigada a arcar com altos custos indispensáveis para a implementação de melhorias contínuas visando cumprir as exigências da LGDP.

A empresa argumenta também que a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em 2018, por meio de recurso repetitivo, decidiu que deve ser considerado insumo e, portanto, apto a gerar créditos, tudo que for imprescindível para o desenvolvimento da atividade econômica (REsp 1221170).

Ao analisar o caso, a Receita afirma que os gastos de implementação da LGPD não estão relacionados ao processo de prestação de serviços, “pois ocorrem em função da proteção de dados dos clientes, constituindo, portanto, despesas, e não custos.”

Essas despesas, segundo a Receita, “embora possam representar importância para a empresa, não estão diretamente associadas à sua atividade-fim, tratando-se de despesas operacionais decorrentes de imposição legal, com as quais a empresa precisa arcar para o exercício de sua atividade comercial.”

O órgão ainda diz que “insumos são aqueles bens e serviços pertinentes ao processo produtivo cuja subtração torne o objeto social inviabilizado”, o que não seria o caso das despesas com a implementação da Lei nº 13.709, de 2018.

A discussão sobre o direito aos créditos de PIS e Cofins com gastos de LGPD já está no Judiciário. Na maioria das decisões existentes até agora, nos Tribunais Regionais Federais, os contribuintes perdem. Apenas uma decisão que se tem notícia do TRF da 2ª Região (TRF-2), com sede no Rio de Janeiro, reconheceu o direito de uma empresa do setor de tecnologia e meios de pagamento por aplicativos de aproveitar créditos de PIS e Cofins sobre gastos para aplicar a LGPD.

A decisão do TRF-2 garantiu ainda o direito de o contribuinte reaver valores pagos indevidamente ou a maior nos últimos cinco anos – por restituição ou compensação tributária (apelação cível nº 5112573-86.2021.4.02.5101).

O desfecho sobre esse embate também pode ocorrer no Legislativo. Douglas Campanini destaca que o Projeto de Lei nº 4, de 2022, discute alterações na legislação para deixar expresso que estes gastos podem gerar crédito. “Se ficar decidido via projeto de lei, isso terá abrangência para todo e qualquer contribuinte, com uma amplitude maior”, diz.

Para Campanini, no Judiciário, “não há segurança para o contribuinte, nem com o trânsito em julgado da ação [quando não cabe mais recurso], depois que o Supremo que definiu que essas decisões podem ser revistas”, diz (RE 955227 e RE 949297).

O advogado Rubens Souza, do escritório WFaria, discorda do posicionamento da Receita Federal ao entender que, no caso, esses gastos não estariam ligados à atividade da empresa. “Esse posicionamento é muito forçado para não reconhecer o crédito porque, obviamente, uma empresa dessas tem uma base de dados dos clientes que precisa dar um tratamento ou sua operação ficará sujeita às penalidades da lei”, diz.

Fonte: Valor Econômico

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