Rendimentos obtidos por sociedade de investimentos com o resgate de cotas de Fundo de Investimentos em Participações (FIP) devem ser tributados regularmente, sem redução de base de cálculo. Essa é a orientação da Receita Federal para os fiscais do país, conforme consta na Solução de Consulta da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) nº 310, publicada recentemente.
Para o Fisco, não importa que a compra e venda de ativos financeiros seja a principal atividade (objeto social) do contribuinte, nem que ele seja tributado pelo regime do lucro presumido.
No lucro presumido, as empresas aplicam um percentual de presunção sobre a receita bruta de 8% para o IRPJ e 12% em relação à CSLL para definir a base de cálculo dos tributos. Em um lucro de R$ 100, por exemplo, incide IR sobre R$ 8 e CSLL sobre R$ 12. Há uma redução na base em relação à tributação regular sobre a receita bruta, que seria de 34% sobre os R$ 100.
Embora a Receita não tenha permitido a aplicação das alíquotas reduzidas, os valores obtidos com a alienação do FIP foram considerados receita bruta para incidência de PIS e Cofins – 3,65% no regime cumulativo. Se não fossem considerados receita, não haveria incidência.
A solução de consulta foi apresentada por uma instituição que investe em sociedades anônimas, limitadas e em fundos de investimento. Recentemente, ela incluiu no objeto social a atividade de “compra e venda de ativos financeiros” – adquiridos para valorização e posterior venda.
Como recebeu um valor referente a cotas de um FIP, mas é tributada pelo lucro presumido, decidiu questionar a Receita. De acordo com a sociedade de investimentos, os rendimentos decorrentes do resgate dessas cotas decorrem do exercício de sua atividade principal. Por isso, para ela, deveriam ser tratados como componentes da sua receita bruta e submetidos aos coeficientes de presunção previstos na legislação aplicável ao lucro presumido para a determinação das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL.
A Solução de Consulta Cosit nº 347, de junho de 2017, determinou que a receita obtida na alienação de participação societária de caráter não permanente por pessoa jurídica que tenha como um de seus objetos sociais a compra e venda de participações societárias deve ser computada como receita bruta, integrando a base de cálculo do imposto apurado com base no lucro presumido. Para o contribuinte, no caso de um FIP a lógica seria a mesma.
Mas não para a Receita. Na nova solução de consulta, o Fisco cita um dispositivo específico da Lei nº 9.430, de 1996, para alegar que alguns valores, dentre eles os rendimentos e ganhos líquidos de aplicações financeiras, devem ser adicionados integralmente na apuração do lucro presumido, “independentemente da atividade ou objeto social desempenhado pela entidade”. A Receita entende que prevalece a norma mais específica.
No mesmo sentido, a Instrução Normativa da Receita nº 1.700, de março de 2017, relaciona uma série de valores que deverão ser acrescidos à base de cálculo do lucro presumido. Entre eles, encontram-se os rendimentos e ganhos líquidos auferidos em aplicações financeiras de renda fixa e renda variável.
“Não se pode conceber que o sujeito passivo possa modificar a base de cálculo do IRPJ, retirando a adição integral dos rendimentos auferidos em aplicações financeiras, prevista em dispositivo legal, por meio de uma simples alteração em seu contrato social”, diz a solução de consulta.
Já com relação ao PIS e à Cofins, a Receita entende de maneira diferente. Considera que os rendimentos advindos do resgate de cotas de FIP são “nitidamente” decorrentes da atividade empresarial. Por serem receitas da atividade ou do objeto principal da empresa, diz o Fisco, integram a base de cálculo das contribuições sociais apuradas no regime da cumulatividade. Como, nesse caso, não há regra mais específica, segundo a Receita, vale a norma geral, de que se trata de receita bruta.
De acordo com Fábio Calcini, do escritório Brasil Salomão & Matthes Advocacia, essa é a primeira solução de consulta que dá enfoque à operação com FIP. O advogado destaca também que o entendimento afeta, em geral, as holdings de investimentos com participação em FIP no ativo circulante. Quando esse tipo de participação está fora do ativo circulante. Quando esse tipo de participação está fora do ativo circulante, diz ele, sua venda gera ganho de capital e não incide PIS e Cofins, mas o IR e a CSLL somam 34%.
Para Calcini, o novo entendimento da Receita é contraditório, deixando os mesmos valores fora da receita bruta quanto à tributação de IRPJ e CSLL, mas dentro para a incidência de PIS e Cofins. “Ao falar de PIS e Cofins eles usam os mesmos conceitos e a Receita entra em contradição para justificar a tributação pelo FIP”, afirma.
O consultor tributário e sócio do escritório Lefosse, Dante Zanotti, interpreta a nova solução de consulta de outra perspectiva. Ele pondera que ela é importante por evidenciar aos contribuintes que, na visão do Fisco, os rendimentos de aplicações em FIP não estão sujeitos aos coeficientes de presunção do lucro presumido, ainda que o objeto social da pessoa jurídica seja realizar esse tipo de investimento.
Em nota ao Valor, a Receita Federal afirma que não há contradição. “Em uma mesma solução de consulta, a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil tratou de duas legislações diferentes, não havendo contradição entre as conclusões apresentadas”, diz o órgão, acrescentando que há uma norma específica que trata dos rendimentos em aplicações financeiras, que não estão sujeitos aos coeficientes de presunção.
Fonte: Valor Econômico