A Confederação Nacional da Indústria (CNI) mapeou 79 processos de impacto para o setor que estão, neste ano, em julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF). Os dados fazem parte da 9ª edição da Agenda Jurídica da Indústria, que foi lançada ontem.
Alguns deles já tiveram o mérito analisado, como a ação que validou a cobrança do diferencial de alíquota (Difal) do ICMS a partir de abril de 2022 (ADIs 7066, 7078 e 7070). Em outros, a discussão apenas começou: por meio da ADI 7589, protocolada em janeiro, por exemplo, a confederação discute a inconstitucionalidade da isenção fiscal dada a produtos importados que custam até US$ 50.
Das 79 ações, 20 são de autoria da própria CNI. Em 27, a atuação é como amicus curiae (parte interessada) e em 32, a entidade apenas observa de perto o andamento. A maioria é de matéria tributária, seguido da área trabalhista – juntos, representam mais de 67% do total mapeado.
Outros campos de interesse são discussões ambientais, como a validade de taxas cobradas a mineradoras nos Estados de Mato Grosso (ADI 7400) e Pará (ADI 4786), assim como questões administrativas, regulatórias e civis, a exemplo do prazo e parcelamento de precatórios (ADIs 4425, 2356 e 6804).
De acordo com o diretor jurídico da CNI, Cassio Borges, apesar de não haver ordem de prioridade entre os processos, o “tema da vez” é o benefício fiscal nas importações de pequeno valor, ação ajuizada em conjunto com a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) e que tem incomodado e muito a base de associados.
Ele afirma que a isenção desses bens ocorre desde a década de 1980, mas que eram operações residuais, sem representatividade econômica como agora. “Aquilo que era inexpressivo, em 2022, representou 4,5% de tudo que o Brasil importou”, afirma Borges, a partir de dados do Banco Central e Receita Federal.
Esse tratamento tributário diferenciado gera a perda de milhares de empregos, além de reduzir em bilhões de dólares o que pode ser arrecadado pelo Estado brasileiro, acrescenta. “Passa a ser inconstitucional porque viola a isonomia tributária na medida em que estabelece benefício fiscal para quem produz lá fora e isso repercute em uma concorrência desleal e deixa de beneficiar o mercado interno”, diz Borges.
Para ele, o Programa Remessa Conforme, criado pelo Ministério da Fazenda, não resolve o problema. “É meritório porque traz um ambiente controlado de compliance e passa a onerar o produto com ICMS, mas não é o ideal, porque o imposto de importação representa, em média, 60%.”
A escolha dos casos em que a CNI vai entrar com uma ADI própria ou atuar como amicus curiae passa por filtro após monitoramento diário das ações em controle concentrado protocoladas no STF. Depois da avaliação jurídica e conversa com as federações e associações para entender as demandas da indústria, os processos são levados à diretoria, que elege os mais importantes – idealmente, não mais que 100 por ano.
Na seção trabalhista, o advogado Bruno Maciel, sócio da Advocacia Maciel, destaca três litígios importantes: a validade do trabalho intermitente (ADIs 6154, 5829 e 5826), das condições para a justiça gratuita (ADC 80) e a exigência de indicação de valores da causa na petição inicial (ADI 6002). Em nenhuma delas o julgamento foi finalizado.
No primeiro caso, há o questionamento da validade do trabalho intermitente, tipo de contrato criado pela reforma trabalhista, em 2017. “Foi um benefício trazido pela reforma, porque afasta a figura da informalidade, garantido algum direito ao trabalhador”, afirma Maciel.
A segunda controvérsia, protocolada pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif), vai definir se a gratuidade nas reclamações trabalhistas deve ser condicionada à comprovação de salário igual ou inferior a 40% do limite máximo dos benefícios da Previdência Social. Hoje, a súmula 463 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) exige apenas a declaração de hipossuficiência econômica.
No caso dos julgamentos tributários, o advogado Maurício Barros, sócio do Cescon Barrieu, ressalta o da seletividade tributária de bens e serviços essenciais (ADI 7195), em que vai ser definido se alguns segmentos como de energia elétrica e comunicação são serviços essenciais. “Embora o Supremo já tenha dado decisões favoráveis para energia elétrica e telecom, pode dar discussão em relação a transporte e combustíveis”, diz.
Barros ainda indica que a validade do voto de qualidade do Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf) também deve gerar debates (ADIs 7353 e 7347) e a da necessidade de aprovação unânime de benefícios fiscais pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), que gera impactos na “guerra fiscal” (ADI 5902).
“Há um contexto legislativo que protege a Zona Franca de Manaus e o Supremo vem sendo favorável em todos os julgamentos tributários. Aqui pode ser a primeira vez que ele não seja”, afirma o advogado.
Fonte: Valor Econômico