O Ministério da Fazenda já trabalha com a possibilidade de não chegar a um acordo com o Congresso sobre as medidas compensatórias da desoneração da folha de pagamento a tempo do prazo estabelecido pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
Apesar de o período para uma solução consensual se encerrar apenas em 11 de setembro, a pasta já tem avaliado os cenários sobre o assunto, diante da necessidade de fazer, antes da data-limite, as contas para a proposta de Orçamento para 2025. O projeto precisa ser entregue até 31 de agosto ao Congresso, e um dos obstáculos é saber como projetar corretamente as receitas previdenciárias em meio à incerteza sobre a medida.
A pasta pediu recentemente que seus técnicos avaliem dois cenários para o assunto e como proceder com a previsão das receitas em cada um deles.
Em uma primeira hipótese, seria considerada a projeção de renúncia com a compensação em valores iguais por meio de medidas a serem apresentadas pelo Congresso. De outro lado, a Fazenda considera a possibilidade de enviar a proposta orçamentária ainda sem uma solução e considerando a reoneração.
O assunto, que vai ser acompanhado pela PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional), é mais um complicador para a elaboração do Orçamento de 2025. Conforme mostrou a Folha, a dificuldade para fechar as estimativas de receitas e despesas tem provocado atraso no processo.
O tema da desoneração passa por um momento de incerteza, enquanto o governo continua no aguardo das medidas compensatórias a serem apresentadas pelo Senado após as duas partes terem acordado em maio a reoneração gradual a partir de 2025.
Até agora, o diagnóstico é que o conjunto sinalizado pelos parlamentares não é suficiente –e, além disso, há discordâncias em relação ao mérito das iniciativas estudadas.
Caso não haja acordo no prazo fixado pelo STF, voltarão a valer os efeitos da liminar que suspendeu a prorrogação da desoneração da folha de pagamentos até 2027.
O Senado defende alternativas como a repatriação de recursos no exterior (com recolhimento de Imposto de Renda), a atualização do valor de bens (como imóveis) na declaração do Imposto de Renda e um Refis (programas de refinanciamento de dívidas tributárias) para multas aplicadas por agências reguladoras.
O Ministério da Fazenda sugeriu aos senadores completar as medidas com o aumento da CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) para todas as empresas, de forma linear, com impacto ao longo dos próximos dois anos. Mas a proposta também não foi bem recebida pelos parlamentares. Com o recesso parlamentar, a negociação ficou suspensa.
Entre lideranças do Senado, chegou a ser ventilada recentemente a ideia de aumentar a CSLL apenas sobre instituições financeiras. Na Fazenda, no entanto, o entendimento é que a elevação teria que ser muito forte sobre o setor para que os recursos necessários sejam garantidos.
O governo também propôs usar medidas de corte de despesas obrigatórias com o pente-fino nos benefícios previdenciários e assistenciais para fechar a conta da compensação.
Membros do governo defendem que o Executivo já lançou diferentes tentativas na busca de uma solução para o assunto, inclusive o envio de uma MP (medida provisória) que alterava as regras do PIS/Cofins –devolvida pelo Senado. O entendimento é que, agora, a solução cabe aos parlamentares.
A desoneração tem uma renúncia estimada pelo Ministério da Fazenda em R$ 26,2 bilhões neste ano, de acordo com cálculos apresentados pelo secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas. Para se ter uma ideia da importância do número, o déficit previsto para 2024 está em R$ 28,8 bilhões.
As projeções fiscais do ano já estão considerando o impacto da desoneração. No último relatório bimestral de receitas e despesas, divulgado na última segunda-feira (22), foi incorporado o efeito do alívio para a folha dos municípios com até 156 mil habitantes. O governo prevê uma perda de R$ 5,2 bilhões com essa medida nos próximos meses (o impacto no ano todo foi estimado em R$ 10,5 bilhões).
Na edição anterior do relatório, em maio, o governo já havia incluído a perda com a desoneração da folha de empresas de 17 setores. A projeção da Receita é uma renúncia de R$ 15,7 bilhões no ano todo nesse caso. No relatório, o governo apontou a necessidade de cortar R$ 15 bilhões em despesas para o cumprimento da meta fiscal.
Como a perda de arrecadação com a desoneração já foi contabilizada no relatório, a eventual aprovação das medidas de compensação podem representar um alívio com a entrada de mais receitas e um fator de ajuste para ajudar o governo no cumprimento da meta fiscal.
Para o ex-secretário do Tesouro Nacional Jeferson Bittencourt, a compensação integral da desoneração é ponto central para o governo chegar mais perto de atingir a meta fiscal. “Na minha conta ainda faltaria um contingenciamento de R$ 10 bilhões, apenas se consideramos as frustrações de receitas com [medida voltada ao] Carf, programa de transação tributária e concessões de ferrovias”, diz Bittencourt que é atualmente head de macroeconomia do ASA Investments.
Para ele, o impacto da compensação integral será mais importante para o Orçamento de 2025 do que neste ano. O ex-secretário avalia que o Congresso, na última hora, ainda pode sair com a ideia de um novo Refis geral para arrecadar no final do ano, como já foi feito no passado. Uma medida desse tipo, porém, vai na contramão dos programas atuais de negociação de débitos tributários.
“O governo optou por ser prudente na estimativa do impacto da compensação da desoneração da folha”, diz o economista Marcos Mendes, pesquisador associado do Insper.
Em relatório para a XP Investimentos, Mendes destaca que qualquer medida de compensação de desoneração que seja aprovada pelo Congresso melhorará a projeção de receita para o ano. Tendo em vista a resistência do Congresso à elevação de tributos, o relatório da XP trabalha com hipótese de que haverá compensação apenas mediante as medidas já propostas pelo Senado, cujo impacto foi calculado por Mendes de aproximadamente R$ 10 bilhões.
Um dos grupos beneficiados com a desoneração é o de comunicação, no qual se insere o Grupo Folha, empresa que edita a Folha. Também são contemplados os segmentos de calçados, call center, confecção e vestuário, construção civil, entre outros.
Fonte: Folha de São Paulo